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Resenha | O Demônio na Cidade Branca de Erik Larson


H. H. Holmes era o típico cavalheiro da sociedade americana no final do século XIX, um jovem médico promissor que esbanjava inteligência e carisma entre seus pacientes, bonito e educado era considerado um dos melhores partidos da região, o que atraía uma legião feminina a sua farmácia. Mas o que ninguém desconfiava é que por trás de todos aqueles sorrisos de simpatia e das feições que transbordavam bondade, existia um monstro , cujas perversões e fantasias com torturas suplantavam em crueldade o bicho-papão da época, Jack, O Estripador. 

Nascido Herman Muldget, Holmes fugiu para Chicago ainda jovem em busca de riquezas e das comodidades que uma cidade grande proporcionaria para a realização de seus desejos macabros, entre eles o anonimato e a fácil obtenção de vítimas. Através de inúmeros golpes e calotes ele conseguiu adquirir uma farmácia, onde construiu uma sólida reputação, os lucros permitiram comprar parte do quarteirão em frente a seu estabelecimento. Os próximos anos de sua vida foram empenhados na construção de seu maior sonho, o famoso "Castelo da Morte".

O Castelo de Holmes era um edifício de três andares que possuía mais de cem quartos, o térreo era formado por pequenas lojas, desde uma farmácia, um relojoeiro, uma mercearia e até serviços de barbearia e restaurante eram oferecidos por empregados de Holmes, o segundo e terceiro andares eram exclusivamente formados por quartos de hóspedes. 

Segundo relatos a beleza exterior da construção era oposta a seu interior sombrio, um verdadeiro labirinto de corredores escuros que faziam curvas estranhas e terminavam abruptamente em paredes rústicas, a impressão geral é que o interior era menor do que a visão externa do prédio levava a acreditar. Isso porque, Holmes em seu projeto, havia adicionado várias passagens secretas, quartos separados por paredes falsas, que o permitiam observar as acomodações, alçapões e rampas que levavam a salas a prova de som, câmaras de gás, e seu projeto mais ambicioso que estava escondido no porão, um  laboratório completamente aparelhado com instrumentos cirúrgicos, no qual dissecava e conduzia suas experiências com cadáveres, além de um forno crematório. 

Estima-se que no período de funcionamento do hotel Holmes tenha matado um número entre 27 e 200 mulheres. Mas como um homem conseguiu construir tamanha estrutura macabra e mantê-la em segredo? Como ninguém notou  a quantidade crescente de mulheres desaparecidas? O método de construção de Holmes foi extremamente inteligente, os operários eram trocados semanalmente, demitidos antes que pudessem descobrir a verdadeira finalidade do prédio, numa espécie bizarra do modelo fordista de produção, exemplo é o engenheiro que projetou o forno crematório, até a descoberta dos corpos acreditou ter trabalhado na construção de uma fábrica de vidros. A resposta para a segunda pergunta é mais simples. Nesse mesmo período ocorreu em Chicago, A Exposição Mundial Colombiana, atração que atraiu centenas de milhares de visitantes a cidade.

A ideia inicial da grande Exposição Mundial de Chicago era comemorar os quatrocentos anos do descobrimento da América por Colombo, mas aos poucos suas gigantescas estruturas arquitetônicas começaram a servir de exemplo para a grandiosidade da população americana, o mundo voltou seus olhos para Chicago e vários países mandaram delegações representativas, a Espanha, por exemplo, mandou três réplicas em tamanho original das três caravelas de Colombo, o Japão mandou um séquito para construir um jardim e um templo e representar sua cultura, do Egito obras e artefatos faraônicos acompanhadas de autênticos moradores da cidade do Cairo e da África uma tribo inteira de pigmeus foi trazida especialmente para a ocasião. 

A Cidade Branca, como ficou conhecida a Exposição, marcou a época como uma das maiores realizações modernas, sua principal atração era uma grandiosa  roda gigante, que tinha capacidade para mais de duas mil pessoas e cuja volta completa demorava mais de vinte minutos. A Exposição reunia centenas diariamente,  nos dias de pico foram registrados quase meio milhão de visitantes, número que deixou a cidade de Chicago à beira do colapso, hotéis com a capacidade máxima improvisavam camas em corredores e salas, restaurantes produziam toneladas de comida todos os dias e a mobilidade urbana foi prejudicada. 

Toda essa reunião de pessoas também marcou a maior concentração de criminosos já vista, a polícia recebia dezenas de chamados por hora envolvendo roubos, assaltos e desaparecimentos, mas devido aos poucos servidores disponíveis apenas os casos que envolviam a nata da sociedade eram investigados. E foi neste cenário de beleza e horror que H. H. Holmes e seu Castelo da Morte floresceram. Erik Larson consegue em O Demônio na Cidade Branca um feito único, uma reconstrução criteriosa e exata da vida de um serial killer, dissecando sua mente psicopata não apenas através de suas ações, mas situando-a geográfica e temporalmente dentro do contexto social da época que a produziu. Para contar a história de um homem, é preciso antes conhecer o ambiente que o moldou e cada palavra presente dentro dessas páginas é real.  Cada nome, cada morte, cada sentimento é perturbadoramente real.

Para conseguir o nível de exatidão histórica presente em seu texto o autor realizou uma minuciosa pesquisa,  as últimas sessenta páginas são uma compilação de notas e fontes, obtidas através de livros, cartas e artigos que serviram de embasamento para a história. A narrativa é a mistura de um suspense policial, construído a partir de um romance histórico e com um toque biográfico, que a torna bastante assustadora. Não é um livro de leitura fácil, Erik Larson utiliza cada parágrafo necessário para contar sua história, não se preocupando com a agilidade do texto, mas sim com a precisão histórica dos fatos. 

É uma leitura tão desafiadora que às vezes chega a ser desgastante, os personagens entram na cabeça do leitor e seus sentimentos se mesclam com seus próprios medos criando uma simbiose de emoções angustiante. O foco segue duas linhas diferentes, uma protagonizada pelo assassino e outra por Daniel Hudson Burnham, o construtor da Cidade Branca, ambas possuem seus próprios atrativos e instrutivas, de um modo que você não encontrará apenas um história sobre serial killer, mas também, um fragmento de um período da História Americana, especialmente de Chicago, recheado de pequenas narrativas. 

Se você é um leitor que busca um livro diferente e desafiante, este livro é para você, a leitura é uma caminhada árdua por caminhos inexplorados, você vai suar, querer desistir, mas no final ficará surpreso com a visão e a experiência que adquiriu. Se quer um empurrão a mais, uma adaptação do livro está sendo feita, protagonizada por Leonardo DiCaprio e dirigida por Martin Scorsese, promete ser o filme definitivo sobre o "primeiro serial killer americano."

   O Demônio na Cidade Branca (2016) | Ficha Técnica 
   Título original: The Devil in the White City (2002)
   Autor: Erik Larson
   Tradutor: Berilo Vargas
   Editora: Intrínseca
   Páginas: 448 páginas
   Compre: Amazon
   Nota: ☠☠☠☠☠☠☠☠☠☠ (10/10 Caveiras)

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2 Comentários

  1. Nossa, curti demais!.. Terei q adquirir! Parabéns!

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  2. Nossa, curti demais!.. Terei q adquirir! Parabéns!

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