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Resenha | A Incendiária de Stephen King


A Incendiária é o quarto volume da Biblioteca Stephen King, coleção da editora Suma que relança clássicos do autor em edições especiais. Como muitos leitores fiquei me perguntando o porque da escolha do título, já que apesar da última edição ter sido lançada décadas atrás, ainda era possível encontrar livros usados em bom estado de conservação por um preço razoável. Mas foi só colocar as mãos na nova edição e começar a leitura que entendi essa necessidade.

O primeiro aspecto a ser destacado é a diagramação, a Suma está fazendo um belo projeto gráfico nesta coleção, mais do que edições de qualidade, com ótimo papel e uma fonte agradável aos olhos, é a personalização de cada título, atentando aos mínimos detalhes, que faz a diferença. No caso de A Incendiária a primeira página de cada capítulo é estilizada  com marcas de fogo e a própria ilustração da capa, um ursinho chamuscado, que reflete com precisão a metáfora central da obra: a traumática perda da inocência infantil. Além de sempre trazer material adicional, aqui um posfácio de Grady Henderson, intitulado "Fantasia Paranoica sob o Efeito de Speed".

Porém o maior destaque é a nova tradução, o texto de Regiane Winarski é ágil e moderno, essa diferença fica perceptível quando se comparam as edições. Por exemplo na antiga a passagem "também, como a mãe quer, o senhor não é nenhum cangancheiro, não estou certo?" é traduzida na nova como "além disso, até onde a mãe dela sabe, você não é cagão, certo?", ou ainda "já passou a hora da pílula e eu a quero... realmente eu a quero, realmente preciso dela." na nova edição aparece como "meu comprimido está atrasado e eu quero ele, quero muito, preciso muito." Essas alterações tornam o texto mais leve e menos repetitivo, e consequentemente a leitura mais agradável. Sem falar que a edição dos anos oitenta tem um "meu chapa" a cada duas páginas!

A Incendiária faz parte de um subgênero da literatura de terror que floresceu nas décadas de setenta e oitenta: o das pessoas com habilidades psíquicas. Neste tipo de história, o protagonista, geralmente uma criança ou adolescente, desenvolve poderes paranormais em uma narrativa caracterizada inicialmente pelas dificuldades de compreensão e controle dessas habilidades. (Para maiores detalhes leia Livros de Terror sobre Habilidades Psíquicas).

Essa não é a primeira vez que Stephen King aborda o tema, em Carrie, Zona Morta e  O Iluminado ele explora o horror que advém do despertar desses poderes, através de uma perspectiva sobrenatural. A origem dos poderes nessas histórias não é importante, mas sim as ramificações da destruição que se segue a descoberta. Em A Incendiária é o contrário, este é o livro em que King se debruça sobre o tema e faz uma dissecação completa da origem científica dessas habilidades.

Na história conhecemos Andy McGee e sua filha Charlie em plena fuga, eles estão sendo perseguidos por uma organização secreta do governo conhecida como a "Oficina", que está atrás de suas habilidades especiais. Quando estava na universidade Andy se voluntariou para um experimento científico, onde conheceu Vicky mãe de Charlie, cujo efeito colateral foi o surgimento de estranhos poderes psíquicos. Andy possui o poder sugestionar as pessoas, porém cada vez que o utiliza sente um pedaço de seu cérebro explodir em dor, enquanto Charlie é uma pirocinética, capaz de produzir fogo com a mente, cujo único limite é a percepção infantil de inocência. 

A narrativa de King é baseada principalmente na perseguição e no desenvolvimento dos poderes da incendiária. Se em Carrie o trauma foi o gatilho para a explosão de suas habilidades, aqui é o contrário, o trauma funciona como um bloqueio aos poderes de Charlie. Stephen King trabalha de forma interessante essa oposição e desenvolve várias reflexões sobre o tema, porém até então, isso já havia sido feito em A Fúria de John Farris. 

O diferencial da obra está na abordagem mais intimista e pessoal que o autor dá aos seus personagens, de um lado temos pessoas comuns que desenvolvem poderes além de sua imaginação e precisam lidar com as consequências dos mesmos; e do outro pessoas normais que se deparam com essas habilidades e por medo ou ganância logo classificam seus portadores como perigosos. Isso fez com que A Incendiária envelhecesse melhor que alguns de seus contemporâneos temáticos, embora sua ambientação tenha forte influência do clima de tensão da Guerra Fria, o que por consequência faz com que a história não seja tão impactante para os leitores atuais como na época em que foi publicada.

Em A Incendiária temos o Stephen King da década de oitenta, escrevendo com precisão sobre monstros humanos e terrores pessoais em uma história que mistura suspense e ficção-científica. Não é seu melhor livro, mas é uma história que precisava ser contada e que fecha seu ciclo de obras protagonizadas por pessoas com habilidades psíquicas com uma interessante abordagem científica. É um livro divertido, com ótimos personagens e um bom desenvolvimento de suspense.  

   
  A Incendiária (1980) | Ficha Técnica 
   Título original: Firestarter (1980)
   Autor: Stephen King
   Tradutora:  Luiza Ribeiro
   Editora: Record
   Páginas: 272 páginas
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   Nota: ☠☠☠☠☠☠☠ (8/10 Caveiras)

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2 Comentários

  1. Fico feliz em saber que a tradução da Regiane melhorou! Achei a tradução fraca em A COOSA, mas aquela foi a primeira dela trabalhando diretamente no texto (antes ela só fazia o copidesque).

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  2. Este é um dos livros pouco comentados do King que gosto muito.

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