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Resenha | Terror a bordo: 17 histórias turbulentas de Stephen King e Bev Vincent


Terror a bordo: 17 histórias turbulentas faz jus ao seu nome, é uma leitura cheia de altos e baixos, com apenas uma parte de seus contos explorando como uma viagem de avião pode acabar se transformando no pior pesadelo possível. Como é usual em uma coletânea temática, cuja maioria das histórias não foi escrita exclusivamente para aquela edição, a seleção tem grandes variações de qualidade: há alguns clássicos indiscutíveis que desbravaram os céus do gênero em seus primórdios e são leitura obrigatória, há algumas boas histórias que aproveitam a altitude da ambientação para elevar o grau de suspense e horror de suas narrativas, e alguns contos péssimos, cuja escolha parece ter sido motivada só para preencher espaço para completar o livro.

De um modo geral a coletânea não é de todo ruim, mas fica muito aquém do esperado, principalmente por não ter uma identidade assumida, apesar de se vender como terror, seu conteúdo perpassa por suspense, mistério, ficção científica e fantasia. Não que essa diversidade seja ruim, mas em alguns casos o medo relacionado a ação de voar tem pouquíssima relação e importância para a história, assim como a própria ambientação dentro do avião ser totalmente subutilizada. 

Os critérios de seleção acertam e erram em alguns momentos, tanto que dá para dividir as histórias da coletânea em dois grupos diferentes: histórias centradas em aviões, que exploram o tema com propriedade e não por coincidência são as melhores, como é o caso de "Pesadelo a 20.000 pés de Richard Matheson"; e histórias que envolvem aviões, cuja importância do objeto é tão pequena para a narrativa que este poderia ser substituído por qualquer outro meio de transporte sem alteração nenhuma para a história, como é o caso de "Zumbis a bordo" de Bev Vincent.

As histórias que mais se destacam no livro são: "O horror das alturas" de Sir Arthur Conan Doyle, onde um piloto nos primórdios da aviação tenta estabelecer um novo recorde de altura e provar que existem monstros vivendo nas grandes altitudes terrestres. O clássico "Pesadelo a 20.000 pés" de Richard Matheson, a melhor história sobre o tema de todos os tempos, onde um passageiro tenta alertar a tripulação sobre uma criatura que está destruindo a fuselagem do avião. O arrepiante "A carga" de E. Michael Lewis sobre um avião  militar que está transportando os cadáveres do suicídio coletivo em Jonestown de volta aos Estados Unidos quando sons começam a ser ouvidos nos caixões. 

"Lúcifer!" de E.C. Tubb e sua premissa fantástica, (imagine um dispositivo que lhe permite voltar cinquenta e sete segundos no tempo, agora imagine descobrir em meio a sua viagem de avião que você está prestes a sofrer um desastre aéreo). "Diablitos" de Cody Goodfellow, onde um passageiro tenta contrabandear uma máscara tribal para dentro do avião e é assombrado por espíritos durante a viagem. Dois contos foram escritos especificamente para esta antologia: "Vocês estão liberados" de Joe Hill e "O especialista em turbulência" de Stephen King.

A história de Joe Hill parece ser uma homenagem direta ao episódio "A odisseia do voo 33" da segunda temporada da série clássica de Além da Imaginação. A ambientação claustrofóbica e a tensão entre os passageiros são similares ao roteiro de Rod Serling, mas ao invés de transportar um avião comercial para os céus do período jurássico, Joe Hill o coloca em meio a uma guerra de mísseis nucleares entre Coreia do Norte e Estados Unidos.

Enquanto seu filho apresenta uma crítica social atual cheia de suspense, Stephen King oferece uma contribuição insossa, que não faz jus ao seu título de mestre do gênero e muito menos a todo o medo que diz ter na apresentação do livro. A trama é simples e versa sobre um personagem que precisa enfrentar seu medo de voar por motivos maiores. O melhor do conto é uma possível conexão com O Instituto, associada a especificidade da fala de um personagem (se você leu o romance sabe do que estou falando) e imaginar como o final do livro afetaria o trabalho do protagonista.

Terror a Bordo é uma leitura que diverte em partes, embora entenda que essa seleção tenha tentado fazer um panorama histórico da abordagem da temática na literatura (e falhado nisso) o abismo entre "histórias centradas em aviões" e "histórias que envolvem aviões" poderia ter sido resolvido com uma curadoria que ampliasse seu raio seletor para além da bolha habitual de leituras de King e Bev Vincent e desse voz a autores contemporâneos. A exemplo do êxito da própria contribuição de Joe Hill. Há vários novos autores que se convidados a escrever sobre o tema dariam um recheio moderno essencial para que a obra funcionasse melhor, pensando principalmente em escritoras de terror, uma perspectiva que faz muita falta nesta antologia. 

Fico imaginando também como seria uma contribuição de Dean Koontz para a antologia, ele realmente tem medo de voar, e apesar de todo o sucesso de seus livros raramente sai do seu próprio estado, a Califórnia, para promover lançamentos exatamente por temer viagens aéreas. Para finalizar,  o título em inglês, Flight or Fright, faz uma espécie de jogo de palavras com o leitor, voo ou susto? Eu fico com voo, nenhuma história me assustou o suficiente para desistir desta comodidade moderna.

   
  Terror a Bordo (2020) | Ficha Técnica 
   Título original: Flight or Fright (2018)
   Organizadores: Stephen King e Bev Vincent
   Tradutora: Regiane Winarski 
   Editora: Suma
   Páginas: 288 páginas
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   Nota: ☠☠☠☠☠☠ (6/10 Caveiras)

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